31 de março de 2008

Momento pânico

Aos tímidos

Como um tímido veterano, posso dar alguns conselhos aos que estão recém descobrindo o martírio de enfrentar este terror, os outros, e a obrigação de se fazer ouvir, ter amigos, namorar, procriar e, enfim, viver, quando o que preferia era ficar quieto em casa. Ou, de preferência, no útero. Para começar, algumas coisas que não funcionam. Tentei todas e não deram certo. Decorar frase, por exemplo. Já fui com uma frase pronta para impressionar a menina e na hora saiu "Teus marilus verdes são como dois olhos, lagoa". Também resista à tentação de assumir um ar superior e dar a impressão de que você não é tímido, é misterioso. Eu sou do tempo em que a gente usava chaveiro com correntinha (além de tope e topete, tope de gravata enorme e topete duro de Gumex) e ficava girando a correntinha no dedo enquanto examinava as garotas na saída das matinés (eu sou do tempo das saídas de matinés). Um dia deu certo, a garota veio falar comigo, ou ver de perto o que mantinha o topete em pé, foi atingida pela hélice da correntinha e saiu furiosa. Melhor, porque eu não tinha nenhuma fala pronta, o que dirá misteriosa, que correspondesse à pose. Evite manobras calhordas, como identificar alguém tão tímido quanto você no grupo, e quando, por sacanagem, lhe pedirem um discurso, passar a palavra para ele. O mínimo que um tímido espera de outro é solidariedade. E não há momento mais temido na vida de um tímido do que quando lhe passam a palavra. Tente se convencer de que você não é o alvo de todos os olhares e de todas as expectativas de vexame quando entra em qualquer recinto. Porque no fundo, a timidez é uma forma extrema de vaidade, pois é a certeza de que, onde o tímido estiver, ele é o centro das atenções, o que torna quase inevitável que errará a cadeira e sentará no chão, ou no colo da anfitriã. Convença-se, o mundo não está só esperando para ver qual é a próxima que você vai aprontar. E mire-se no meu exemplo. Depois que aposentei a correntinha e (suspiro) perdi o topete, namorei, procriei, fiz amigos, vivi e hoje até faço palestras, ou coisas parecidas. Mesmo com o secreto e permanente desejo, é verdade, de não estar ali, estar quieto em casa.

Luis Fernando Verissimo
Zero Hora - 27/03/2008

É. Apesar de não parecer muito, eu tenho ataques súbitos de não querer falar em público, mesmo que esse público imenso seja a meia dúzia de colegas que convive comigo há dois anos. Hoje tive uma pequena amostra disso.

Nem quero pensar na apresentação do Projeto Experimental (auditório, três turmas reunidas, professores, PowerPoint, microfones...) no fim do semestre. Na realidade, nem no textinho da prévia do projeto na quinta eu quero pensar muito.

Todo caso, segue o baile.